Neuza de Oliveira Marsicano
“Os espelhos são usados para ver o rosto; a arte para ver a alma.”
Ao receber
o convite para inscrever no Congresso Internacional de Educação, que
fez parte da rica
programação das comemorações dos
10 anos de Inhotim, foi a possibilidade
de conhecer lugar mágico. Fiz logo minha
inscrição. Essa viagem me surpreendeu de maneira especial, o que pretendo
mostrar ao longo do texto.
Fui imaginando como seria chegar naquele
território recheado de contemporaneidade, diversidade e sinestesia. Por isso
mesmo, pensei no lugar e três coisas vieram em mente: vanguarda dos sonhos, do
diferente, do inédito, de tudo aquilo na arte que faz contemplar e refletir,
sonhar, talvez com um mundo mais cheio de autenticidade, talvez sensível aos
problemas da natureza humana, talvez mais empático, ou tudo isso ao mesmo
tempo.
A segunda coisa: território
internacional, étnico, de diversidade, onde pessoas do mundo todo, com suas
linguagens, vestimenta, interesse e contemplação reúnem-se num espaço único
pelo propósito de interação com a arte e a natureza.
E para compor a tríade de
expectativa e realidade, esta muito bem atendida, emerge o diferencial sinestésico
de Inhotim: já havia lido e visto descrições fabulosas sobre as inusitadas
experiências sensoriais, seja pelo estímulo de som, de cores e de texturas,
dentre outros.
Chegando em meio a uma imensidão
verde, notei várias garagens abertas onde se reparavam carros quebrados e me
fixei também nas montanhas, com suas entranhas abertas entre a vegetação
exuberante e desordenada. Ao cruzar, ao longo dos trilhos de trem de ferro,
desativado, eis a chegada no misterioso
museu, que nega todas as regras daqueles convencionais, fui me encantado pela
bela e misteriosa paisagem local.
Abrindo e fechando um pequeno
histórico do museu, idealizado pelo mecenas mineiro, o empresário Bernardo Paz,
o espaço possui uma estrutura organizada para receber pessoas do mundo inteiro,
e, embora haja a necessidade de compra de ingresso para visitá-lo, a exceção
fica por conta da quarta-feira, eis o dia democrático...reconfortante. Unindo
arte e natureza, o Inhotim foi aberto em 2006, e, segundo informações já
recebidas no local, através de seus monitores, desde essa data, o museu recebeu
milhões de pessoas, e conta também com lanchonetes, restaurantes, lojinha de
souvenir e todo conforto para quem não deseja ou não tem a possibilidade de
caminhar a pé ao longo de seus caminhos entre um setor e outro: é que existe a
possibilidade de se alugar carrinhos, como aqueles de golfe.
Com uma estrutura fantástica iniciou a Abertura do Seminário com Conversa Inaugural, o tema
interessante “Educação Humanizadora: Múltiplas Perspectivas”, proferida pelo
professor José Pacheco, autor da Escola da Ponte em Portugal, sagrou-se como um
momento de encanto. E assim, foram três dias com palestrantes do Brasil e de
vários países da Europa. Ponto de
destaque foi o concerto de encerramento do Seminário com a Orquestra
Filarmônica de Minas Gerais. Simultâneo ao Seminário fomos guiados para visitar os vários pavilhões espalhados
pelo museu ,ambientados pela bela e
misteriosa paisagem local, e agora passo a narrar alguns momentos
marcantes para mim.
Entre as galerias, o que me
surpreendeu mais foi a Forty Part Motet, criada pela artista canadense Janet
Cardiff, uma instalação sonora, gravada pelo coro de Salisbury Cathedral,
entoando o moteto Spem in Allium, do compositor inglês Tomas Tallis (1505-1585), uma belíssima composição polifônica sacra.
É uma reprodução em quarenta canais, cada qual com sua caixa de som, e em
pedestal, simulando uma formação espacial humana de um coral. Entrei para ficar
um pouquinho...caminhei pelo salão, ouvindo caixa de som por caixa de som, ou
melhor, uma experiência de várias categorias de
vozes, a diversidade de um coral completo. Quase não consegui sair...a
beleza e a sensibilidade hipnotizante...
Subindo um dos
mais altos morros do lugar, mais um pavilhão que vale a pena ser registrado: O
Som da Terra, o Sonic Pavilion, de acordo com reportagem (conf. Elle), consiste
num dos trabalhos imperdíveis de Inhotim, levando cinco anos para ser
concretizado. Obra do artista americano Doug Aitken, trata-se de um pavilhão
oval, com uma cavidade de 200 m de profundidade, em que o ele colocou uma série
de microfones. É uma espécie de amplificação do “som da terra”. Tive a
experiência sensorial de deitar em volta da cavidade, de olhos fechados,
ouvindo um som inédito, mais um som da natureza indescritível.
Narcissus Garden é uma
plataforma em que dois lagos artificiais geométricos em suspenso e
interligados, da excêntrica artista japonesa, Yayoi Kusama, conhecida
mundialmente pela obsessão pelo tema dos círculos, esferas, já tendo feito a
vitrine mais bela de Louis Vuitton em Paris. De acordo com informações do
próprio site do Instituto Inhotim, a instalação é composta por 500 esferas de
aço inoxidável, que por sua vez, flutuam sobre o espelho d'água do Centro
Educativo Burle Marx. Com os vento, pude perceber a movimentação das esferas,
num baile de luz e de variação de
formações, que ora se unem, ora se afastam, refletindo toda a natureza em
volta, além do próprio espectador. Encantador e incitador de reflexão!
Não há como deixar de mencionar uma
das maiores coleções de palmeiras do mundo, e algumas esculturas que se
harmonizam com a natureza. Presença de totens, e outras esculturas espalhadas
para que o espectador se surpreenda também com a arte fora das galerias e
pavilhões. Experiência de encher os olhos, de encantar os ouvidos, refletir com
fotografias cotidianas, entrar em salas monocromáticas ou em salas com
projeções: uma ode à sinestesia.
Deparando-me com os demais
visitantes, contemplo a universalidade do encanto com a natureza e a arte,
acreditando que ambas podem ser a chave de uma resgate do belo, do humano, do
natural, do criativo e da reflexão.
Deus criou a natureza e o homem, o
sonho de um homem, Bernardo Paz, criou uma realidade que é Inhotim, uma
realidade que reúne os melhores devaneios artísticos e sua natureza exuberante:
obrigada, Inhotim, por existir e ser tão perto de mim, fisicamente e
metafisicamente!
Revista Elle. Edição 280. Ano 24. Setembro de 2011.
Site do Instituto Inhotim: <http://www.inhotim.org.br/inhotim/arte-contemporanea/obras/narcissus-garden/>. Acesso em: abr. 2017.
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